Empresas penalizadas representam apenas entre 0,5% e 1% da frota dos Estados e algumas autuações revelam falta de sintonia entre licenciadores e fiscais
O Sindicato Nacional das Empresas de Aviação Agrícola (Sindag) avalia como positivo o resultado geral das operações Demeter e Deriva II, realizadas por órgãos federais e estaduais em outubro e novembro, no RS, PR, MS e MT – para o combate a irregularidades no uso de agrotóxicos no campo. Porém, contrassensos na interpretação do Ibama sobre as regras ambientais dos Estados e as competências do Ministério da Agricultura – ao sobrepor sua atuação ao trabalho desses órgãos – demonstram a falta de entrosamento entre as entidades das forças-tarefas quanto às rotinas e burocracias de cada uma. O que prejudica mesmo quem pensa estar trabalhando dentro da lei.
Essa avaliação deve nortear os próximos passos do sindicato para cobrar do Ibama, Ministério da Agricultura e outros órgãos uma definição de competências e uma orientação única para as fiscalizações. As operações nos Estados foram solicitadas pelo Ministério Público Federal e encabeçadas pelo Ibama, com participação da Anac e órgãos estaduais.
“Entre os empresários aeroagrícolas, foram 14 aeronaves lacradas nos quatro Estados, o que representa entre 0,4% e 1% das frotas em cada um. O dado deixa claro o cuidado que a grande maioria dos empresários têm com a atividade”, explica o presidente do Sindag, Júlio Kämpf. Ele destaca que o próprio sindicato aeroagrícola tem reiteradamente se manifestado aos órgãos governamentais o desejo do setor de que as fiscalizações sejam uma rotina – por forças-tarefas ou como rotina de cada órgão. “Temos conversado com promotores e autoridades em diversos Estados sobre isso. Inclusive dentro da Comissão de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos do Mato Grosso do Sul, da qual o Sindag é membro”.
Porém, nas ações dos últimos dois meses, apesar da maioria dos apontamentos terem sido corretos (quanto à tipificação das infrações, já que os valores das multas estão sendo contestados), houve episódios que poderiam prejudicar a própria credibilidade da atuação dos fiscais. Sem falar no mal-estar gerado no setor por apontamentos equivocados que tiveram grande divulgação na mídia pelos próprios órgãos envolvidos nas operações. “Via de regra, apesar de uma ínfima parcela ter sofrido autuações, todo o setor foi exposto como bandido, sofrendo multas de mais de R$ 1 milhão”, lamenta Kämpf.
ISENÇÃO IGNORADA
O caso mais emblemático ocorreu no Paraná, onde os seis aviões lacrados, pertencentes a empresários aeroagrícolas, tiveram como justificativa dos fiscais para a atitude a falta de uma licença estadual que simplesmente não é exigida pelo Estado, segundo o Instituto Ambiental do Paraná (IAP). E cuja isenção foi atestada pelo próprio IAP. Mesmo com o ofício do órgão estadual declarando a isenção apresentado no ato pelos empresários, os agentes do Ibama interditaram os aviões dizendo que o órgão estadual deveria ter expedido o documento – com as mesmas informações e assinatura – em um formulário diferente.
No Rio Grande do Sul, a fiscalização ocorrida em outubro apontou um decréscimo considerável nas autuações sobre o setor. De uma frota de 418 aviões agrícolas no Estado (segundo a Anac), apenas cinco aeronaves foram interditadas, entre três empresas autuadas. O número é muito menor do que em 2016, quando foram 38 empresas autuadas e 57 aeronaves interditadas por problemas diversos (desde documentação atrasada até problemas de manutenção). Para o Sindag, uma diferença muito positiva, porém, não sem arestas a serem aparadas.
DEBATE NO RS
Sobraram reclamações dos operadores aeroagrícolas e dos próprios produtores rurais gaúchos sobre a forma como os fiscais teriam chegado, como em uma batida policial: em grandes grupos, armados e tratando de maneira ríspida os produtores, operadores e funcionários. Isso e algumas queixas sobre competências de licenciamento e duplicidade de fiscalizações. O que gerou uma reunião no dia 30/11, entre representantes do Sindag, Farsul, Federarroz, Irga, Ministério Público, Ibama, Anac e dos secretários estaduais de Agricultura, Ernani Polo, e de Meio Ambiente, Ana Pelini, além de quatro deputados federais gaúchos: Luís Carlos Heinze (PP), Alceu Moreira (PMDB), Afonso Hamm (PP) e Jerônimo Goergen (PP).
O encontro ocorreu no auditório da Secretaria Estadual do Meio Ambiente (Sema) e o Sindag propôs que as licenças ambientais fossem emitidas pelos órgãos que as efetivamente fiscalizasse. O exemplo que motivou o posicionamento foi de uma das empresas autuadas, que recebeu do Ibama uma multa sobre a falta de licença do Estado sobre o pátio de descontaminação – um dispositivo de segurança que só a aviação agrícola tem.
O pátio estava em funcionamento e vinha sendo operado de maneira eficaz, mas sua licença final estava emperrada na Sema, onde a orientação era de que os fiscais tivessem bom senso. “Se é o Ibama quem vai fiscalizar, queremos que também seja ele a licenciar. Assim se evita orientações conflitantes e temos apenas um órgão do qual cobrar agilidade”, resume Kämpf, que participou do encontro.
AUDIÊNCIA COM MINISTRO
O dirigente aeroagrícola também cobrou do próprio ministro da Agricultura, Blairo Maggi, maior presença do órgão nas ações de fiscalização e controle da aviação agrícola. Foi no dia 21 de novembro, durante uma audiência do Sindag no gabinete do ministro, em Brasília. Segundo a legislação sobre a aviação agrícola, desde a década de 60 o Mapa é o principal órgão regulador e o que detêm a prerrogativa de fiscalização da atividade.
Ao todo, de acordo a ANAC, o Brasil tem uma frota de 2083 aeronaves agrícolas – segundo levantamento de janeiro de 2016 no Registro Aeronáutico Brasileiro (RAB). O setor completou 70 anos em agosto deste ano e a frota é a segunda maior e uma das melhores do mundo (atrás somente dos EUA). A aviação responde por entre 25% e 30% das aplicações no trato de lavouras do País. E, apesar dos mesmos produtos aplicados por via aérea serem aplicados também por terra (e com os mesmos riscos), a aviação é a única ferramenta com legislação própria (e ampla).
Uma importante ferramenta em um universo com 973.438 pulverizadores costais e 458.055 pulverizadores terrestres, segundo o censo Agropecuário de 2006, do IBGE. “Por ser a única regulamentada, é também a mais fácil de ser fiscalizada. Fiscalização essa que nos interessa, mas que precisa ser coerente”, conclui Kämpf.